James Wallis fundou a Hogshead Publishing em 1994. Seria a sua forma de lançar Bugtown, um RPG revolucionário que não usava dados nem números, que ele tentava lançar desde 1989 sem sucesso. Esse jogo nunca foi lançado. Wallis revolucionou o RPG do mesmo jeito.
Uma cidade de insetos
Wallis se envolveu com RPG com fanzines e logo se tornou um pupilo de Erick Wujcik (Teenage Mutant Ninja Turles & Other Weirdness, Amber Diceless). Com os contatos de Wujcik, ele começou a trabalhar com a editora Palladium, produzindo suplementos tradicionais.
O projeto pessoal de Wallis, porém, era publicar um RPG baseado nos quadrinhos do cartunista Matt Howarth. Wallis tinha um acordo verbal com Howarth para desenvolver o jogo e um ideal de design muito claro: um RPG sem números e sem dados. Os testes desse jogo, Bugtown, foram muito bem recebidos. O problema era conseguir publicá-lo.
Wujcik se ofereceu para ajudar o pupilo através da sua editora, Phage Press. Porém, anos se passaram e o projeto não andava. Wallis culpou o perfeccionismo de Wujcik, chamando-o de controlador. O jogo simplesmente nunca estava bom o bastante. Sempre havia alguma coisa a mudar.
Em dois anos de trabalho, eu não escrevi uma única palavra do manuscrito para lançamento de Bugtown de fato. Eu escrevi e reescrevi e reescrevi documentos de playtest e regras, e descrições de conteúdo para o livro, e Erick os mandava de volta e dizia que não estava certo — nada estava certo nunca. - James Wallis
Wallis desistiu de trabalhar com a Phage Press e manteria mágoa de Wujcik até depois da morte do mentor. Porem, o autor havia escrito um jogo de cartas chamado Once Upon a Time para a Atlas Games e tinha contato com Jonathan Tweet, que na época era o manda-chuva de RPG da Wizards of the Coast. Tudo estava certo para Bugtown finalmente ser lançado depois de 5 anos de trabalho árduo. Até que o cartunista Howarth não conseguiu chegar a um acordo com a Wizards of the Coast sobre royalties de camisetas (!).
Se Wallis queria ver Bugtown publicado, ele teria que fazer tudo sozinho. E foi o que ele decidiu fazer.
Erick está morto. O que pelo menos significa que ele parou de me encher o saco pra adicioná-lo como amigo no Facebook. - James Wallis
Cabeça de porco
Wallis fundou sua empresa, Hogshead Publishing, para publicar Bugtown. Para chegar a esse ponto, porém, ele precisava de dinheiro. Sabendo que a Games Workshop queria licenciar um RPG de Warhammer, ele entrou de cabeça na oportunidade. Parecia um plano de negócios adequado — ganhar dinheiro com Warhammer Fantasy Roleplay, publicar Bugtown.
Não deu muito certo. Problemas de caixa, com a Games Workshop e com um distribuidor na Europa quase fecharam a empresa. Wallis teve que demitir todos os funcionários, incluindo a si mesmo. Ele trabalhou de graça por nove meses até empresa sair do buraco.
Infelizmente, a essa altura do campeonato, Bugtown não podia mais ser publicado — pelo menos não por Wallis. O cartunista Matt Howarth preferia que Erik Wujcik e a Phage Press publicassem o jogo. Wujcik nunca publicou Bugtown. Diante dessa situação, Wallis destruiu todas as anotações que tinha sobre o jogo. Bugtown estava oficialmente morto.
Mas Wallis estava prestes a finalmente revolucionar o RPG com suas ideias.
Estilo novo
Em 1998, James Wallis lançou um jogo chamado The Extraordinary Adventures of Baron Munchausen. Nesse jogo, ele propunha um “novo estilo” de RPG.
Cada jogador improvisa uma história baseada num assunto sugerido, lidando com interrupções e adendos de demais jogadores. Isso pode parecer familiar hoje em dia, já que temos vários jogos baseados na mesma premissa, como Fiasco e Violentina. Isso começou em 1998, com o “novo estilo” da Hogshead.
Munchausen não foi o único lançamento da linha. Wallis começou a convidar outros jogos com ideias similares para se encaixar no seu modelo. Os livros eram, em sua maioria, curtos — variando entre 24 e 32 páginas. As fileiras do novo estilo logo foram engrossadas por Violence, de GregCostikyan, que é mais um ensaio político que um jogo e não foi muito bem recebido; Puppetland, de John Taylor, que se afasta da temática do novo estilo e se aproxima do narrativismo de Ron Edwards; Pantheon and other roleplaying games, de Robin Laws, uma coletânea de jogos no novo estilo e finalmente De Profundis, que incluía regras de correspondência para jogar através de cartas. Nobilis, um RPG mais tradicional mas que não usava dados, foi lançado pela Hogshead mas não é parte da linha novo estilo.
Mas tem aquela coisa: o autor de Fiasco não disse que ele não é um RPG?
Story games
Uma galera fica toda eriçada sobre a definição do que é ou não é um RPG. Nós chamamos os cinco jogos nesse livro de RPGs para irritar essas pessoas. Se você encontrar alguém ficando puto sobre isso na internet, por favor zoe-o por nós. — Robin Laws, Pantheon and Other Roleplaying Games (2000)
Quando Munchausen foi lançado, ele foi indicado para o prêmio Origins de Melhor RPG. Ele não ganhou, talvez pela discussão sobre ele ser de fato um RPG ou não. Se o RPG é definido como assumir um papel, esperava-se que o foco fosse nesse papel, no personagem. Não é o caso de Munchausen — embora os jogadores tecnicamente assumam o papel de personagens, o que importa é a história que eles contam.
Desde então, muito se conversou sobre o novo estilo e sobre story games. Alguns afirmam que nem se trata mais de jogos! Isso levou parte da comunidade a cunhar o termo “story games”, abraçado principalmente pelo criador de Fiasco, Jason Morningstar.
Seja chamando de new style ou de story game, a verdade é que James Wallis revolucionou o RPG. Só não foi do jeito que ele esperava.
Saiba mais
Para um post do próprio Wallis sobre Bugtown (em inglês), clique aqui.
Para uma comunidade construída em torno de story games (em inglês), clique aqui.
Para uma discussão sobre Fiasco ser ou não um RPG (em inglês), clique aqui.
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